Por Dai Varela

Fotografia do arquivo pessoal

Artemisa Ferreira, jovem autora cabo-verdiana, torna-se com o livro “Gruta Abençoada” a primeira a publicar no género da literatura erótica em Cabo Verde. Apresenta-se como uma pessoa complicada de definir, alguém a descobrir. Nos finais de 2008 inicia-se na escrita erótica, um género que sempre a atraiu, tendo sempre sentido admiração por todos os que abraçam este género. A autora abre-se nesta entrevista para revelar sua faceta de escritora erótica.

 

O que te fez sentir que teus escritos eróticos já estavam prontos para publicar?

Quando comecei a lê-los com outros olhos e admirá-los. O brilho e o calor que me irradiavam convenceram-me.

Quando é que te deste conta desta tua faceta de escritora erótica?

Desde que comecei a rabiscar as primeiras linhas, no liceu, lia muito “O Cântico dos Cânticos” do Rei do Salomão, que achava muito lindo e tentava imitar. Entretanto, sempre me contive perante a tentação de tomar meus escritos mais a sério. Foi em 2008 que comecei a expulsar o que vinha dentro de mim. Foi uma sensação de dever cumprido para com a minha pessoa.

 Aceitas este ‘rótulo’ de escritora erótica?

Ainda não, mas quero lá chegar. É uma arte linda que faz parte do dia a dia, do nosso quotidiano.

 Para ti quais são as características da boa literatura erótica?

É algo de que estou à procura. Contudo, até aqui sei que não tem que ser banal e não se deve confundir com o pornográfico. Também tem que carregar a essência do belo e sobretudo a escrita tem de tocar a pele de quem lê.

 Inspiras-te nalguma referência neste género?

Várias são as referências que admiro muito. Porém, quando escrevo tento limitar as suas leituras, de forma a não me influenciar pelos seus estilos. Há vários autores que gosto de ler, como Carlos Drummond de Andrade, Florbela Espanca – que é mais subtil – e também Olga Savary, bem como o escritor cabo-verdiano Germano Almeida, ou as literaturas japonesas, etc.

 Como leitora sentiste falta desta literatura ou este olhar erotizado nas publicações literárias em Cabo Verde?

A literatura cabo-verdiana sempre trouxe um cheirinho do erótico nos contos, romances e poesias. O que ainda não existia era uma obra totalmente erótica como a “Gruta Abençoada”. Conhecendo a nossa cultura, já era tempo, visto que isto sempre existiu na sociedade.

Quanto da Artemisa está nos teus versos eróticos? Falas de experiência própria ou situações ficcionadas?

Os escritores, por mais ficcionada que seja a sua escrita, nunca fogem da sua pessoa. Sempre tem lá no fundo o verdadeiro “eu do autor”. É neste “eu” que podemos identificar e diferenciar a identidade de cada autor. Os meus escritos não fogem à regra: alguns são ficcionais, mas não imaginários (risos).

Consideras que a tua escrita é erótica ou sobre sexo?

É uma escrita erótica, porque escrita sobre sexo não carrega a essência do belo, presente na erótica. O que escrevo é para ser cheirado, sentido e não colocada em “prática”. É como quando tocas suavemente a pele de uma pessoa para fazê-la sentir teu toque e tu por tua vez sentir seu cheiro e sua respiração, não para fundir no sexo explícito.

 Em Cabo Verde há o desejo de ler sobre sexo?

Em Cabo Verde lê-se sobre sexo nas páginas de Germano Almeida ou nas literaturas eróticas. Arrisco-me a dizer que é mais fácil encontrar uma pessoa a ler sobre esse género do que sobre os outros. Certa vez, uma pessoa disse-me nunca tinha lido um livro na vida, mas a “Gruta Abençoada” leu até ao fim e repetiu. Claro que não me baseio apenas nesta situação, mas é apenas um dos exemplos. Talvez quando mais obras do género forem publicadas, principalmente as que estão na gaveta.

Mesmo numa sociedade – de certa forma – conservadora decidiste publicar “Gruta Abençoada” com teu nome verdadeiro. Não sentiste a necessidade de publicar com um pseudónimo para evitar certos julgamentos populares?

Estamos numa sociedade em que somos julgados antes do nosso próprio nascimento. Já estou acostumada. Não sou contra que se opte por pseudónimo, mas não gosto de o fazer. É esconder, é mostrar medo de ser encarado pela sociedade. A escrita é a forma de descobrir a identidade de um autor e eu não tenho razões para esconder-me.

De onde surgiram as maiores críticas ou preconceitos à tua escrita erótica?

Até agora não recebi críticas de uma forma negativa ou preconceituosa. Na verdade, sou elogiada e incentivada a continuar. Houve uma altura em que algumas pessoas me sugeriram bloquear ou colocar alguma alerta no meu blog (artemisaferreira.blogspot.com) por causa dos menores, mas em relação ao livro ainda não recebi críticas negativas.

Sentes-te uma transgressora ao escrever sobre sexo em Cabo Verde?

Não, muito pelo contrário. Outros já o fizeram e continuam a fazer, eu apenas me atrevi a trazer uma obra completamente dedicada ao erotismo.

Qual a importância que o erotismo assume para ti?

Sinto-me no meu habitat (risos).

Pretendes investir mais neste segmento? Quais são seus próximos trabalhos?

Pretendo investir mais sim e continuar a aperfeiçoar cada vez mais neste género e não o abandonar (risos). Projetos são vários, para além da literatura quero levar o erotismo para o cinema. No ano passado terminei um artigo sobre o tema do erotismo que está por publicar e cada dia aparecem novas ideias e planos.