A tradição é secular. O pano de terra ou “panu di terra” é na verdade, um tecido típico feito de forma artesanal em teares manuais. Foi nos séculos XVI e XVII uma moeda de troca no comércio da costa africana, transformando a economia do país.

Manteve-se teimosamente enraizada na cultura do arquipélago e hoje os cabo-verdianos exibem-no, orgulhosamente, como uma das imagens de marca e a mais pura arte “made in Cabo Verde”.

O “panu di terra” tradicional é feito apenas em algodão e com as cores branca e preta. São confecionados em teares improvisados utilizados inicialmente pelos escravos capturados da costa da Guiné. Teve tanto peso na economia do arquipélago que chegou a ser utlizado nas sentenças dos tribunais. Os réus quando eram condenados a pagar multas avultadas pagavam em pano de terra.

Esta tradicional peça de vestuário resulta de uma faixa longa e estreita… de cerca de 180 cm de comprimento e 17 cm de largura, uma peça única em seu estilo cor e formato. A sua irregularidade acaba por garantir a sua própria autenticidade.

Em média cada uma artesão demora cerca de seis horas a manufatura-la e cada peça é vendida no mercado nacional por 1.200 escudos cabo-verdianos.

As tiras são usadas com frequência à volta da cintura durante a genuína e tradicional dança do “Batuku”, para salientar os movimentos do corpo.

Segundo reza a tradição, os panos eram bastante usados nos funerais. As mulheres cobriam as suas cabeças com panos grandes e limpavam as suas lágrimas nele. Era também utilizados nos atos e momentos simbólicos, nomeadamente nas cerimonias de pedido de casamento, onde a presença dos panos era quase que obrigatórias, um sinal de respeito e consideração. Era também muito utlizado pelas sogras que ofereciam as meninas em vésperas de casamento. Estas acabariam mais tarde por utilizar os panos para carregar as crianças às costas, enquanto trabalhavam.

Tradicional das ilhas de Santiago, Fogo e Brava, Cabo Verde desenvolveu uma verdadeira indústria têxtil de fabricação destes panos. As cores tradicionais eram o preto e o branco, no entanto, hoje, encontram-se pano de terra de todas as cores que representam uma inovação nesta arte. A sua utilização como uma marca nacional ganhou terreno e conquistado franjas mais amplas da sociedade civil cabo-verdiana, nomeadamente a elite politica” e sobretudo a juventude. Os panos di terra deixaram de ser um tecido utilizado apenas pela população rural e nas últimas décadas ganharam expressão, notoriedade e palcos internacionais.

As confeções de moda têm introduzido também elementos de pormenor em pano de obra, numa alusão clara ao orgulho nacional.

Na verdade, o padrão é definido na altura de colocar a linha no tear logo no início do dia de trabalho. Atualmente, em Santiago é feito com a linha vinda de Dakar e a introdução de outras cores e padrões tornou-se numa novidade que é vista no mercado com habitualidade.

As peças variadas são utilizadas hoje com frequência por individualidades políticas, artistas nacionais, homens e mulheres com destaque na sociedade cabo-verdiana. Exibem panos di terra como o símbolo da mais pura arte crioula.

Hoje, este emblemático tecido inspira a moda cabo-verdiana. Virou uma referência “ chic” que empresta um estatuto identitário forte. A utilização do pano de terra em tecidos para confecionar vestidos, fatos, camisas, gravatas, chapéus, cintos, brincos, colares, toalhas, casacos lenços, carteiras para senhoras agendas para homens, enfim tem-se revelado uma verdadeira forma de valorizar a cultura cabo-verdiana. Atualmente não há artistas ou artesãos locais ou estilistas, alguns de renome que não se inspiram nos padrões e traçados do “pano di terra”.

Nas principais cerimónias e evento públicos do país, exalta-se o orgulho nacional. Ate mesmo os logotipos do estacão nacional de Televisão de Cabo Verde, a TCV, foi inspirada nos traçados do panu di terra. O facto é que hoje, o tecido virou fonte de inspiração de todos os que que vem na criação artística uma forma de conquistar nomes no mercado. Cada um tenta marcar a diferença. Ousa e cria, disputa e tenta inovar.

A história do tradicional panu di terra, a sua visibilidade hoje e a forma como el tem sido exibida pelos cabo-verdianos quer no pais e essencialmente na diáspora, tem chamado atenção de muitos estrangeiros. Alguns, inicialmente por mera curiosidade, lançam-se no terreno à procura de conhecer a história destes tecidos e lançam-se no terreno à descoberta da forma da sua confeção e acabam fascinados pela arte.

Passam dias noite e semanas no interior das ilhas. Instalam-se juntamente com os produtores, pequenos artesãos: por vezes ate montam estruturas e criam empresas. Empregam jovens, dao formação, solicitam apoios para empoderar homens e mulheres e juntos trabalham num design mais apurado, investem na qualidade, criam marcas e lançam-se no mercado com produtos mais caprichados e com uma qualidade mais garantida.

O facto é que de tao representativa que o pano di terra se tem revelado, que acabou por ser a peça escolhida pelo chefe de estado Jorge Carlos Fonseca durante a sua visita ao vaticano.

Foi a peça que o chefe de estado cabo-verdiano encontrou para oferecer ao Papa Francisco. O mesmo gesto se repete em momentos simbólicos em que em causa esta a imagem que marca Cabo Verde. São poucas as malas que acompanham representações diplomáticas cabo-verdianas ao exterior que não levam dentro algo com referência a pano de terra.

Hoje eles são encontrados em todos os cantos da cidade, com destaque para os quiosques e exposições culturais. No mercado, é o produto nacional mais exibido aos turistas. O pano di terra ganhou definitivamente o estatuto de ponto focal da cultura cabo-verdiana.

A emblemática faixa revela e carrega para qualquer lugar a indiscutível identidade cabo-verdiana. O símbolo de orgulho Nacional Made in Cabo Verde.